Um bolero


Levantei a mão e a chamei pra dançar. Ela tinha lábios, olhos e cabelos que acompanhavam o mesmo tom. Era assim, pequena por fora, gigantesca por dentro. Havia algo nela como uma droga, me viciava em vê-la dando voltas ao redor dos meus braços. Ela tinha um vestido meio branco, meio cor de nada, meio cor de tudo, com flores na barra e um bordado nos seios. Ela tinha uma linda voz, que era grave e rouca. Escandalosa: é a palavra que define a gargalhada dela, mas não me importo se olham.

Ela dançou comigo, com pés no chão, enquanto a poeira subia e vi notas de violão saindo de suas mãos fazendo círculos que ao redor dela que mais parecia bambolês de fogo. Me hipnotizou, de forma curiosa, com graça e ao mesmo tempo, com uma pitada de malícia. E rodava, e rodava. Quando dei por mim, ela já estava rodando em outros braços e tudo o que pude fazer foi ver.

Eu à perdi pra música. Eu à perdi pra dança. O que eu amei tanto, me tirou o que eu poderia ter amado. Então me pus a pensar, só assim pra entender como não se pode ter tudo na mão. Aí tirei meus sapatos e entrei na dança e na dança eu me deixei levar. Foi aí que entendi que não havia necessidade de querer prender pra mim, o que já era meu por natureza. Que em outros braços ou não, a volta sempre termina no mesmo lugar em que começou.

Senti paz, então pude levantar poeira. E no meio da poeira me perder em nuvens cinzas, nuvens sem cor e coloridas. Névoas completas de Maria e Carlos. Onde me perdi e onde achei ela, dançando entre a poeira, dançando entre bambolês de fogo.

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