O espaço






Hoje eu a vi na rua. Como há muito tempo tem sido, ela se veste de vermelho para não mostrar o cinza que tem tomado espaço.


Hoje ela me disse que está saindo do lugar que ela estava. Hoje ela falou sobre seus planos comigo. Levou-me para seus lugares favoritos, e com uma voz em fade, ela me contou seus segredos ao pé do ouvido. Ela há muito não se revelava assim.

Ela começou cantando aquela música que falava sobre castelos de areia. Disse-me que essa música a acalmava nos seus momentos mais frios. Eu então aprendi a tocar essa música para ela. Ela me disse que a música que falava de estações, tirava da cabeça dela todas as outras músicas. Então, eu aprendi a tocar essa música para ela. Ela disse que a música que falava sobre os campos de algodão, fazia ela se sentir alguém mais forte, mais viva, mais colorida. Então, prometi a ela que tocaria essa música.

O que me deixou impactado foi quando ela me falou sobre o silêncio que ela queria ouvir: Hoje não havia mais desenhos na parede, nenhum blues a faria dançar na roda, nenhum violão prenderia sua atenção, hoje nem o sexo e nem o álcool limparia a cabeça, hoje não tem brincadeira.


Aí então foi que me perguntei e comecei a sentir falta daquela risada pneumática. Seus olhos que se esquivavam dos meus, como um convite. Sua boca quente, quente, quente, quente, quente... Seu corpo ardendo em cima do meu, seus cabelos vermelhos que iam ao alto do quarto. Da forma que ela falava sobre seu futuro tão pequeno, da forma que falava sobre seu passado tão grande. Como ela queria viver e como ela me via.


Eu senti tanta falta disso, quando dei por mim, ela atravessa a rua mais movimentada daquele campo e seu corpo se perdeu dentre carros e motos amarelos. E como antes contratado, ventos me açoitaram pela sua falta. Como ela disse. Hoje sinto a falta dela, que eu nunca senti.
 x

Desvendando

Note apenas o que for notável.



De novo você me chama a atenção para falar sobre um relacionamento que você tanto idealizou. Olhar por fora da situação e sair julgando tudo é muito simples, principalmente quando se tem como uma grande capa protetora o Criador. Mas hoje quero falar com você te tratando pelo nome. Da forma que você é e não de como se criou.

Eu já disse aqui e direi novamente, que é inacreditável eu ver você fazer todas essas coisas novamente. Que trabalho dei eu à você. Vejamos bem: quando me tiraram o meu bem mais precioso e nunca mais me mandaram rosas, não lhe pedi ajuda. Quando gigantes me tiraram o ar, o peso, me jogaram na parede, eu ainda estava lá, subindo a água do poço pra você beber. Quando ele disse: "Good Bye", não foi pra você que pedi pra que ficasse.

Lembra de quando seu coração começou a explodir. Só nós duas trancafiadas num local só. O que eu fiz? Fui até meus inimigos pedir ajuda. Lembra quando as tempestades assolavam nossos barquinhos e estávamos eu e você juntas? O que eu não aguentei por você? E uma criança, apenas uma criança lutando contra tudo e todos pra conseguir dar um orgulho que fora antes prometido.

Quando meu tédio se fez presente e meus ideais tomaram o lugar de uma fé insana, cinco dias de vida você me deu, não sabendo que tinha me matado ali mesmo. E com meus punhos, eu atravessei vidros, derramei meu sangue em meu nome, quando você disse que me derramaria de você.

Mas depois de todas as portas fechadas que você me deu, depois de todas as vezes que me virou as costas, por que fechar os olhos verdes pra mim?

Por que?
Por que?
Por que?

Go


Depois de uma grande névoa, ela se sentou e calou-se. E mesmo que o violão e os carros rangessem, parecia pra mim um grande silêncio, causado por um soco no vento.
Segurando a água contida de várias e várias tempestades que assolavam o barquinho azul, ela continuou a segurar-se no silêncio.
E aos poucos, a névoa se desfez e pude ver que aqueles olhos cor de vinho já não eram os mesmos, pois toda água escrevera alí uma frase ainda não terminada. Jamais terminada. Ainda.
E por trás daquela boneca de lata (como a lata do seu melhor carro) com lábios bem desenhados e vermelhos era nada mais do que carne e osso. Música e fotos. Sonhos e idéias. Mas naquele momento era como "Ball and Chain".
Pesada, cansada. Um vida vivida por uma criança tentando sobreviver num mundo desabitado. E como uma rosa que perdeu seu caule, ela murchava. Todos seguiam seus olhos, pra tentar novamente ler o que estava lá. Ela, não via nada. E com uma cabeça que já não fantasiava mais as borboletas, nem zebras, nem vagalumes, nem contos de fada, ela segurava ainda o Oceano que havia em seu corpo.
Eu olhei pra minha pequena. Minha boneca, minha pequena vermelha, e como eu queria ter o poder de tirá-la de toda aquela cena. Fechar o teatro e dizer: "Vamos embora".
Naquela tarde, não havia nuvens no céus suficientes para ofuscar a luz daquela armadura mal forjada. Naquela noite a Lua se escondeu. Naquela noite, morta com uma só bala, de um certo baleiro, um serial killer desfarçado, matou minha pequena vermelha.
E manchou os lençóis todos de vermelho, e todas as paredes desciam como uma meia-calça em perna de moça, no tom de seus olhos.
Nada mais eu poderia fazer. Porque ela entrou no descanso que ela tanto pediu. E aí começou minha agitação, como em Summertime. Eu pude ler nos rodapés das paredes, enquanto em meus braços eu via uma vermelha ficar cinza e sumir no meio da mesma névoa que me fez achar.
NONONONONONONONONONONONONONONONODONTYOUCRY!
Uma pequena guerreira, que entrou numa guerra sem querer. E saiu daqui com água nos olhos, uma fita no cabelo cinza e me deixou com uma seda escarlate. Ela saiu com marcas em todo o corpo de um guerra que ela não queria ter lutado. Uma criança, ela só é uma criança. Ela saiu da guerra no mesmo silêncio que entrou. E ainda hoje, há sussuros de sua voz gravemente aguda por todo ambiente.