Super-exposição

E agora é a vez dela.
Ele levantou a mão e me chamou pra dançar. Colocou-me em seus braços pra que eu pudesse rodopiar. Eu tenho cabelos com cor de ameixa gorda, e meus olhos e lábios seguem o mesmo tom. Meu vestido é como creme que se coloca no café americano e flores ao meu redor.
No meio da dança, comecei a ouvir a música me falando coisas novas. Porque eu estava dançando sobre meus castelos de areia, recém construídos, mas eu ainda ouvia a viola me falar sobre seu velho blues. E eu a segui.
Ela me fala sobre seus velhos amores e dos frutos deles. Me conta seus porres de ópio, das suas viagens de Maria, das noites com Carlos. Fala-me de viagens à outros planetas, me mostra um céu vasto de estrelas, cada uma com sua individualidade.
E eu apenas, segui. Quando dei por mim, eu já estava rodando por outros braços. Mas tudo bem, por que a nenhum deles eu pertencia. Seria só a música e eu naquele momento. Ninguém mais pra estar no meio das preliminares ou nas introduções da música.
Quando numa volta ao mesmo lugar eu vi o nobre senhor, que de nobre já pouco tinha, sentado num bloco de vidro oco, pensando "se viu ou não viu"¹. Parecia irritado, mas mesmo assim, forçava aquele sorriso com dentes cerrados de ódio. Ele não precisou falar nada, nem mesmo me olhar de outra forma, pra que eu me sentisse uma propriedade mal construída dele. A única coisa então que pude fazer, foi dar a ele um pouco da libertação que eu tinha.
E ele dançou, e encontrou no que eu encontrei, uma paz que de longe se percebia. O que eu amava, foi amado por quem eu poderia amar, mas não. Por que levantar poeira foi uma sensação gloriosa, perto da beleza de um amor findável.

¹: Trecho do poema: Num Pacato Vilarejo - Hebe Coimbra

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