Um sonho de uma noite de verão

Naquela noite não houve festa, ela não havia bebido, mas seus olhos borrados de preto denunciavam que algo tinha acontecido. Ela entrou na sala cambaleando só, mas falava muito com alguém que nunca apareceu.
Não estava linda, mas estava com algo que certamente me chamou atenção. Pulse estava estampado em seu corpo, como outrora fora dito, de curvas sutis. Deitou-se no sofá azul e ficou olhando fixamente para o teto cinza. Se eu pudesse ter tocado ela, aposto que estava frio, pois sua perna estava arrepiada, e arrepiava toda vez que ela sorria. Sua boca pálida evidenciava sua exaustão, sua sede.
Eu a observava como quem observa uma tela, procurando detalhes onde não existem. Eu a sentia totalmente desassociada de minh’alma e intimamente ligada a ela. Sabe quando a tristeza se torna bela? É exatamente o que pensei quando vi.
Sorrateiramente o cinza do teto começou a se escurecer. Parecia que todo o Atlântico tinha caído sobre ela. Nunca houve chuva como aquela. Da janela cozinha a Lua se espremia entre uma nuvem e outra e conseguia iluminar o rosto vermelho dela com uma luz azulada. Os raios gritavam alto e iluminavam a cidade que tinha dado blackout. Cada um deles como um desenho de Frank Miller. A casa estava escura. Apenas um feixe de luz saindo da janela da cozinha.
Calmamente, ouve-se a porta correr em seus trilhos. Ele está ensopado. A água molha seu rosto e a luz da cozinha transforma cada gota em um prisma. De longe, ele está se derretendo em cores. Ofegante. Ele fica parado na porta enquanto escoa todas as cores que ele tem pelo chão.
Ela levanta apressadamente do sofá e para poucos centímetros dele. Olha em seus olhos que também estão borrados, como nos fins de noites. Ele sorri tristemente para ela. Ela começa então a tirar silenciosamente e serenamente sua roupa. Relógio, colete, camisa, calça, samba-canção. Ele fica ainda com os coturnos, arrepiado por completo. Ele está deixando-a molhada aos poucos.
Eu queria ter mãos de Zakuro pra pintar aquela cena, pois certamente, é uma das coisas mais lindas que já vi. Ele escoando sua alma em cores, ela o secando com cabelos como se fosse a própria Maria Madalena secando os pés de Jesus.
Ele então, brutalmente crava as unhas em sua cintura, levanta ela e joga seu corpo sobre o sofá azul. Abre suas pernas como quem rasga um lençol velho. Se encaixa perfeitamente entre elas. Os olhos amendoados dela estão redondos, estáticos e assustados. Ele está louco e perturbado. Passa a mão no rosto. Arranha as suas pernas. Encara a moça. Então, deita sobre Pulse com olhos úmidos e esbraveja como um bárbaro: Nunca Mais.

Nenhum comentário:

Postar um comentário